8.21.2009

Travessia da Madeira

Ouvir!Apesar de termos desistido ao fim do segundo dia, devo dizer que algumas das recordações mais fortes destas férias datam deste passeio. Na verdade, acabámos por interromper o percurso porque havia uma passagem de que eu já não me lembrava (e que era realmente muito simples). O Victor Hugo ficou muito irritado comigo, porque o caminho tinha sido terrivelmente duro até ali, e agora tínhamos de fazê-lo todo outra vez. A levada dos Balcões (o caminho interdito) é, sem dúvida, uma das experiências mais poderosas da serra da Madeira. É pena que, no seu livro, o John e a Pat Underwood se limitem a dizer que está a cair aos bocados. Pois está, mas havia certamente muito mais a dizer sobre ela.

Fizemos o caminho de volta a uma velocidade incrível, e quase sempre em silêncio, como seria natural. Foi uma situação em que vi a morte bem de perto, ali, insistentemente, sobre os abismos da Fajã da Nogueira. Pouco depois de termos iniciado o regresso, deu-se uma espécie de catarse. O Victor mudou por completo de atitude, começou a andar muito mais à vontade (agora em cima do muro de apoio da levada e não dentro dela, porque este de facto não é um percurso para fazer com medo das alturas). O ritmo era impressionante: acabámos por fazer o caminho de volta num terço do tempo que gastáramos para lá. Com isso, poderíamos perfeitamente ter rumado até à Central da Fajã da Nogueira, para depois acampar junto aos tis, conforme o plano. No entanto, o Victor Hugo confessava-se desmoralizado, estava mais numa de ir para o Funchal.

Eu também não quis insistir, porque me sentia um bocado porco (no dia seguinte, caso continuássemos o passeio, teríamos inevitavelmente de pedir um banho ao Senhor Luís; a ele ou ao fantasma, considerando que ele já não trabalha lá em cima), porque estava incomodado com aquelas duas mochilas a tiracolo (a armação não era assim tão confortável) e porque sabia que a subida da Fajã da Nogueira ao Pico Ruivo não ia ser nada fácil. Provavelmente ainda ia ser pior do que aquela que tínhamos feito de manhã, entre a Origem da Levada do Castelejo e o Chão dos Pessegueiros. Eu estava numa de chegar a casa, à noite, tomar um bom duche e depois seguir directamente para a cama. O problema é que, quando chegámos ao Ribeiro Frio, não sabíamos bem como voltar para o Funchal. A camioneta já tinha passado, e eu não conseguia falar com o meu pai. O Victor não queria ir para São Jorge, e também não estava numa de telefonar à Bárbara, a prima, porque não lhe tinha dito nada durante as férias e agora era um bocado foleiro ligar-lhe a pedir boleia. Uma hora depois, lá consegui falar com o meu pai.

Estava-se muito bem, no Ribeiro Frio, àquela hora e com perspectivas de voltar para casa. O meu pai chegou, e fomos comer uma açorda ao Poiso. A açorda estava óptima. Chegámos ao Funchal por volta das onze e meia.

Pois é, acabámos por fazer apenas meia travessia da Madeira (ou talvez nem tanto), mas ficou a promessa de fazermos todo o percurso para o ano, desde que o traçado esteja devidamente acautelado. Na verdade, o Victor até queria fazê-lo de imediato, mas eu não achei a ideia muito famosa, porque tinha outras coisas a fazer.

5 de Setembro de 2002

Está programada para amanhã, dia 22 de Agosto, uma Travessia da Madeira tal como planeada pelo Angelus. A travessia tem seu ponto de partida na Ribeira de Natal (Fajã da Nogueira) e só termina três dias depois em Lamaceiros. O evento, organizado pelo Scherzan, está descrito em detalhes neste documento. A não perder.

1 comentário:

Scherzan disse...

Levaremos o Angelus connosco no coração. Certamente será emocionante relembrar as caminhadas feitas na sua presença e faço questão de atravessar a ilha com as suas botas habituais.

Obrigado pela publicação.
Um abraço