6.15.2008

Dois no Rio

Ouvir!Com a incessante banda sonora do Fausto Fawcett a acompanhar cada um dos nossos passos, os Dois lançaram-se numa exploração do moderno Rio. E o Rio está muito bem e recomenda-se, mas talvez soe um pouco foleiro, ou 'cheesy' como dizem os ingleses, falar dos Dois assim, com letra maiúscula e tudo.

Enfim, o que importa é que os Dois estiveram lá, e tiveram tempo para contemplar cada uma das maravilhas da cidade maravilhosa com a atenção que se lhe exige... quer dizer, nisso levou um certo avanço o Saavedra, que pôde a provar a inigualável feijoada do Copa, tão boa tão boa que rebenta a escala e merece sete estrelas, mas depois recuperei eu pelo facto de ter chegado pelos Santos Dumont, cuja aproximação e aterragem permite, segundo o Guia Quatro Rodas, algumas das mais fascinantes vistas da cidade.

É claro que existem outras, como a do heliporto do Corcovado e a do Arpoador.


Não chegámos a perceber porque é que o Marius não aparece no guia Quatro Roadas, porque o empregado nunca chegou com a resposta, mas de resto vimos respondida a maior parte das perguntas que havíamos alimentado pelo caminho: o Copa é o hotel mais bonito da cidade? É. O Hotel Marina existe mesmo? Existe, sim, e fica na orla de Ipanema. Ostentava, curiosamente, um dos ditos do Profeta Gentileza.


O Porcão é mesmo o melhor restaurante da cidade? É claro, se pensarmos na relação qualidade-preço e na excelente vista da Lagoa Rodrigues de Freitas.

Melhor carne que essa só indo ao Fogo de Chão em São Paulo, que em contrapartida não tem sushi nem entradas tão generosas.

O Bondinho e o Corcovado valem a viagem? Valem com certeza!










As garotas de Copacabana e Ipanema continuam mais gostosas que nunca? Olha, para já essa frase não faz muito sentido, e eu não vi bunda nenhuma. Nem cheguei a ver nenhuma das patricinhas do Leblon. Houve um dia que demos uma saltada à Barra da Tijuca, e lá também não vi bunda nenhuma, nem vi nada que valesse a pena conhecer, o que inclui o olvidável restaurante Mercado do Peixe. Já no Leblon vale bem a pena passar pelo melhor restaurante de sushi da cidade, o Sushi Leblon (atenção que para os brasileiros a palavra japonesa se pronuncia com acento no fim), e pedir uns económicos menus executivos regados com o melhor saquê da casa.




Ainda que à Barra não valha a pena ir, valerá a pena com certeza ir um pouco mais adiante e visitar a Prainha e o Parque do Grumari. Essa zona, informou-me o Saavedra, era antigo posto de peregrinação dos hippies da MPB dos anos setenta, como a Gal e o Caetano, personalidades agora consagradas que não avistámos por lá. Para chegar a essas praias basta apanhar uma das vãs (PB para 'carrinha') que passam pela Nossa Senhora de Copacabana de manhã bem cedo e que atravessam a Avenida das Américas em alta velocidade, pedindo para saltar no cruzamento do fim da avenida antes de virar para Santa Cruz. Daí para a Prainha depois é só pegar (PB para 'apanhar') um dos cômbis que vão pela estrada de terra e que apresentam na sua frontaria uma tabuleta dizendo 'Recreio'.




Eu infelizmente não cheguei a encontrar a Vanessa da Mata para lhe perguntar afinal porque é que ela insiste tanto nesse 'boa sorte', mas, mais importante do que isso, fiquei a saber que lá eles pronunciam esse antropónimo como Vanêssa, assim mesmo, com vogal fechada, o que não deixou de me deixar um tanto intrigado. Mas enfim, nada de muito estranho, tendo em conta que eles insistem em dizer Málu Máder (alegando continuamente que o primeiro nome é paroxítono, como se não houvesse lugar a uma estratégia de resolução do conflito acentual) em vez de Malú Madér, como dizemos aqui, o que está em grande contraste com a pronúncia de Elis, que eles pronunciam como uma verdadeira oxítona, quando aqui em Portugal toda a gente sempre diz Élis, vá-se lá saber porquê. É um diferendo que costuma haver entre os Dois, e que certamente ainda vai dar que falar. Do lado do PE, é possível argumentar que de facto, sendo esse um nome de origem hebraica, como muitos dos actuais Elis que por aí andam, terá de ser acentuado na primeira sílaba. Por outro lado, o do PB, é possível argumentar que, como qualquer antropónimo, essa é uma estrutura adaptada à fonologia do português, e que, da mesma maneira que não passa pela cabeça de ninguém dizer Dinis com acento na primeira sílaba, também não se deve dizer Elis como paroxítona. O que é, convenhamos, um argumento de peso contra uma pronúncia como Málu Máder.

A verdade é que existem muitas assimetrias entre o português europeu e o português do Brasil, e eu maravilhei-me a estudar as assimetrias lexicais do sistema de palavrões. Provavelmente já todos sabem que 'tabaco' é palavra de uso restrito por terras de Vera Cruz, mas eu pelo menos não sabia que lá 'rabo' se opõe ao nosso 'cu' como a palavra que não deve ser usada em público para designar o traseiro. O órgão genital fenimino é algo que não designam de modo ofensivo fazendo referência à sua natureza encoberta, o que se compreende: quer dizer, mais sexista será um termo como 'vagina', que era o nome latino para a bainha onde o homem guarda a sua espada, do que esse tal de 'cunnus', que só mesmo portugueses e ingleses podem achar tão abjecto.

De volta a Portugal, reparo que o novo acordo ortográfico foi aprovado, e percebo que acabei de passar para outra ordem de grandeza. Enfim, embora ache o acordo tecnicamente mal executado, pelas razões que antes referi e por outras tantas que ainda poderão ser descritas, fico contente por agora poder usar o adjectivo cônica, escrita desta maneira, para falar de umas das minhas palavras favoritas do português.

6.11.2008

Arnold Antunes, Live in the Studio: 5*

Ouvir!Late offerings by Arnold have been met with mixed feelings: avant-garde fans like Saavedra immediately embraced them as a meaningful progression in style whereas die-hard fans of the old Titans stuff, like this one here, have expressed lukewarm opinions towards it.

To me this Live in the Studio affair has come as a real surprise: I would never expect to like it so much, being one of those pesky dudes not so fond of his mellower style of late... and definitely not fond of his Tribalist adventures.

Lesser known outputs such as the great Name obviously score way more points on the creativity department, while still retaining a rock flavour to it. But as Saavedra rightly claims being experimental and less accessible is just a phase you go through you should grow out of.

Thing is, the richness Do Know and Any present in terms of melodic and poetic content they seem to lack in groove power. Sure, melody and poetry per se are sufficient to have a pretty decent album out there, specially with a writer of such high calibre. But it's no wonder why some of the older or 'experimental period' fans start yawning.

Now what we get with this Live in the Studio concert is a perfect balance between melo(w)dy and groove, music and poetry, voice and instrumentation. And a handful of tunes you really stay hooked to. Give it a couple of listens, and you'll be humming it for the rest of the week.

Of course I wouldn't rate it so highly had Arnold not included some of those oldies goldies like the ever-impressive What. Having them combined with exponents of his melodic side such as Do Know and Any works big time.

And what to say of the covers he went for? The nightside beauty of Lights is rightly fit just before the angry final song, and Something is worth the price of the product alone. Check out the voice solo right after the Flamenco guitar part. Nothing short of spectacular there! Monsieur Gaétan can certainly be proud of what Arnold did with one of his most successful tripped-out experiments.

Something and some of the other tracks like the melancholic I Will Not Fit and I'm Not from Your Street, with right-on-the-money contributions from Nando Reis and Branco Melo, clearly make you think of all the thought that was put into the arrangements. Even the extra mellow One to One by the Tribalist bunch can work wonders, filled as it is with its nice soccer allegory. Perfect for a time out of Euro 2008, one could say.

So all things considered this gets to be one the best Brazilian stuff I have ever heard in the soft side category. Lyrics- and arrangements-wise, you can't beat Arnold. Just listen to the first minute and half of the album: the slighty odd meter of Any together with incredible out-of-the-blue linguistic transitions like 'Qualquer carne, alcatre, quilo, aquilo sim e porque não?' can only make you go: 'wow!'