Querido Marcos,
Agora vou falar do Andrea, um outro: o Andrea Zanetti. É verdade que conheço dois, mas a mensagem é sobre o mais novo deles.
Como deves saber, o nome Andrea deriva do grego «aner», homem. Ademais, como é amplamente divulgado, foi André o discípulo que, de acordo com a lenda, teria morrido numa cruz em forma de X. Detalhes que podem não revelar absolutamente nada, mas que também não precisam ser necessariamente descartados como irrelevantes. O Andrea que conheço tem o ar de querer ser algo assim, homem. Mas num sentido quase metafísico: o homem que olha para além do abismo, como se de fato estivesse olhando para si próprio, a velha história...
É possível que seja essa a razão para manter-se quase sempre recuado, aquela postura quase sempre pétrea. O Andrea vive num mundo que criou para si, em que ele é o homem e nada além disso poderia interessá-lo. Como é tarefa particularmente difícil manter uma postura assim grandiosa, ele prefere então não dizer absolutamente nada acerca do que pensa. Outro dia, por exemplo, a Adelina quis saber o que ele tinha achado do filme que tínhamos acabado de ver, e o Andrea retrucou com a mesma pergunta. É assim a típica reação do Andrea. Eu vejo e me divirto, é verdade, porque agora o conheço bem. E é bem possível que seja mesmo esse o motivo de seu ódio mais recente.
O que importa mesmo ao Andrea é estar numa posição em que a sua fragilidade não seja exposta. Assim, por exemplo, usa a mais trivial das estratégias que é a de se envolver com mulheres pouco inteligentes. Ou, ao menos, mulheres que não tenham respostas para as perguntas que ele mesmo não sabe responder. Não é difícil concluir, então, que o Andrea calcula cautelosamente cada um de seus passos; evita os passos em falso - ou o que quer que para ele isso queira significar.
Orgulho, egocentrismo, maldade, frieza: é por trás de qualidades tão infantis que o Andrea procura esconder a mais profunda beleza. Teima em permanecer numa adolescência disparatada com igual fervor com que insiste em tocar o mesmo tipo de música que ouvia aos quatorze anos. Autodenomina-se misantropo e profere, sempre que tem oportunidade, ser incapaz de beijar alguém aos lábios. Ora, os misantropos não oferecem oportunidade ao diálogo e o diálogo, afinal, é bastante perigoso para quem precisa ocultar-se.
Tudo muito interessante se o limite entre o que quer transparecer e o que de fato é não fosse assim tão tênue. O Andreas vê-se então no mais desagradável dilema, e por conta disso é que não consegue escapar ao patético.
É um jogo muito perigoso esse o que o Andreas costuma jogar, porque envolve os que o rodeiam. Muito ambicioso, ele traça o futuro com o interesse com que quer manter a imagem que julga a mais apropriada. Concentra-se no trabalho, julgando-o muito mais [politicamente] interessante que os amigos, uma festa, uma namorada. O que há para se saber acerca de quem quer que seja? Quem para que precisa de ajuda? Isso, é verdade, pouco interessa ao Andreas como Andreas quer.
Quando estava para ser crucificado por pregar o evangelho, o apóstolo André recusou-se a morrer da mesma forma que o seu líder espiritual. Prontamente ataram-no numa cruz em forma de X. Desde então, a cruz em forma de X passou a ser símbolo da humildade e do sacrifício. O Andrea, está claro, não vai poder chegar aí.
Um beijo.
10.24.2009
Algo Assim, Homem
Lisboa, 24 de Outubro de 2002, 9:01h
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1 comentário:
Não estará a subestimar as mulheres desse Andrea? As personas não duram muito para quem quer que seja.
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