10.28.2009

Sinceridade e Silêncio

Sinceridade é uma palavra muito interessante. Eu estive a ler algumas coisas sobre a sua etimologia, e encontrei duas opiniões divergentes: alguns acham que sincerus resulta da concatenação do radical sin- (que está presente na palavra singular, por exemplo) com o radical cer- (que está relacionado com o verbo crescer), significando 'que cresceu de uma só proveniência, puro'; outros acham que resulta da lexicalização do sintagma sine cera, aplicando-se originalmente, no tempo do império romano, ao mármore cujas imperfeições não tinham sido tapadas com cera, isto é, ao mármore genuíno. É claro que esta segunda é muito mais engraçada, principalmente se pensarmos na especialização de significado entretanto havida. Nesse aspecto, a palavra sinceridade tem uma relação muito interessante com polidez. Uma pessoa pode tentar polir o mármore até que ele fique sem imperfeições, dessa forma evitando recorrer à cera.

Agora deixando as metáforas de lado (é curioso reparar como o significado supostamente original das palavras tem agora de ser considerado uma metáfora), eu acho que não sou uma pessoa muito sincera. Pois é, porque o silêncio também serve para cobrir aquilo que não pretendemos dizer. Não sou muito sincero nem tenho a intenção de sê-lo, porque há sempre coisas que eu quero guardar para mim mesmo. Há coisas que eu quero guardar para pensar depois, coisas a que eu não quero ter de responder. Nesse sentido, eu sinto-me um pouco infantil, e é uma coisa que me agrada. Eu sei que é uma coisa que pode levar a que as pessoas não gostem de mim, mas normalmente não faço nenhum esforço para mudá-lo. Seja como for, não o faço por desprezo, e também tento evitar esse pensamento quando os outros o fazem a mim.

Por outro lado, é bom que se diga que ninguém diz tudo o que lhe vem à cabeça. Nesse aspecto, penso que o valor do silêncio é universal. É como na Teoria da Optimidade. Nós temos o Gen e depois o Eval. O som desta segunda palavra também pode ter umas certas conotações diabólicas, e nem sequer é preciso pôr as letras ao contrário. Dependendo da qualidade dos filtros, podemos ter pessoas mais ou menos sinceras, mais ou menos honestas. O silêncio é também um filtro, e é provavelmente o mais básico e o mais forte de todos. Se uma pessoa recorrer muitas vezes ao silêncio, provavelmente não é sincera. No entanto, se não recorrer quase nunca ao silêncio, também não é garantido que seja uma pessoa sincera.

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